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quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Violência


Onde estamos seguros? Ainda há um porto seguro? A sociedade não aguenta mais tanta violência nos quatro cantos da cidade. Manaus é uma onda de violência tremenda. É orar toda vez quando sair para qualquer lugar desta cidade. Onde você menos espera está sendo assaltado. É dar graças a Deus quando se sai incólume de um atentado qualquer.
confirmando essa infeliz realidade, constatei de perto, de tão perto, senti na pele a aflição de quem passa por uma situação violenta,de roubo, de assalto.
Na noite de terça-feira, do dia 28/12/10, por volta das 22:30 min,. dentro do ônibus da linha 517, pude passar por uma quase fatalidade, uma quadrilha entrou nesse coletivo e rendeu o motorista e o cobrador, em seguida, foi assaltar os passageiros que retornavam aos seus lares, após um dia de trabalho. Não era para menos, a aflição por que os passageiros passaram era intensa, todos se abaixavam, alguns choravam; foi quando um passageiro pediu o chip de seu celular o qual um dos bandidos roubaram, este não gostando pediu que o passageiro se calasse, o outro comparsa deu ordem para que matassem o passageiro, a gritaria foi geral, o bandido começou a disparar, uma.. duas vezes e arma nao disparou, então o passageiro gritou que não havia bala. vários passageiros correram atrás do bando que pediu ao motorista para abrir a porta da frente. Pularam a catraca e sairam correndo ladeira abaixo. E os passageiros atrás, conseguiram capturar um bandido e uma adolescente envolvida na confusão. Esta foi espancada com chutes e pontapés. A polícia em seguida conseguiu capturar o resto do bando. A arma do assalto só não disparou as balas porque estas estavam frias. Segundo um policial, a arma era um calibre 32, e se as balas tivessem detonadas fariam um estrago. "Vocês tiveram sorte" conclui ele. Vimos a ira da polícia, espancando os assaltantes, com muitos chutes, tapas... A cena me chocou, tanta violência. Não sei se é certo, se é errado. Sei que o que o bando fez não é correto, mas a violência não é um caso isolado. Muitas pessoas estão por detrás disso tudo. O poder público tem sua parcela de culpa, os governantes tambem tem, a própria sociedade idem, quando escolhe mal seus representantes políticos. É preciso coibir, sim, toda forma de violência, contudo, melhor é criar meios para que crianças, jovens e adolescentes se afastaem cada vez mais das drogas, prostituição, bebidas alcoólicas e outros males.
Até mais!

Descaso governamental


"Já não sabemos o que há de vir pela frente, desonestidade, descompromisso e descaso vêm assolando o nosso estado, em todo canto desse nosso imenso e riquíssimo estado do Amazonas. Eeste último problema (descaso) perpetua-se, é lamentável a falta de bom senso e honestidade de todos os que passam pelo poder. Em Manaus, temos como exemplo a Ponte do Rio Negro e a Av. das Torres; ambas, obras inacabadas, superfaturadas. A ponte, que era pra ser inaugurada em novembro, não se sabe ao certo a data de sua inauguração, além de ser uma obra superfaturada. Quem investiga isso? Onde andam os fiscais do povo, eleito pelo povo para investigar essas obras; estão mordendo umas migalhas do poder público? Cadê o assessoriamento para colaborar com a decência e moralização que tanto se promete em épocas de eleição? A quem recorrer e confiar de verdade? O descaso é grotesco, na Av. das Torres já ocorreram vários acidentes, isto porque não há uma sinalização nem fiscalização adequadas. Não basta somente construir, é preciso suporte técnico. A ponte do bairro do Educandos que o diga. Assim que foi entregue à população, roubaram a fiação e hoje está ás escuras, tornou-se um local perigoso para quem trafega por ali. E são tantas ocorrências de descaso que não caberia nesta folha. Mas estamos de olho, denunciaremos tanto quanto for preciso".
Até mais!

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Numa noite de Natal qualquer

Gostaria de começar com o trivial: "Feliz natal"... Esse jargão já dura mais de mil anos e nem por isso, na época natalina, deixa de ser repetida por milhares e milhares de pessoas. Acontece que em muitos casos essa frase não se encaixa com seu momento, muita gente se embriaga, estraga comida, mata no transito e mesmo assim soletram F.e.l.i.z n.a.t.a.l! O mito do Feliz natal tanto me incomoda, para alguns o importante é reunir os amigos nessa noite, tanto faz se está chovendo ou não. Outros seguem a tradição - reunir toda a família para ceiarem juntos, há ainda aqueles que procuram um templo para orar e agradecer. Mas, certamente a noite do natal não importa, mais antes acender a chama do Cristo em nossos corações e comemorar o Natal verdadeiro com o próximo em qualquer noite, na rua, na esquina, no quintal ou em casa, não importa.
Feliz Natal!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Barulho pode afetar sabor de comida de avião, diz estudo


Barulho pode afetar sabor de comida de avião, diz estudo

Uma pesquisa conduzida por cientistas holandeses e ingleses pode dar pistas sobre os motivos que fazem com que alimentos servidos durante voos comerciais sejam considerados sem gosto.

Segundo os cientistas, o barulho do ambiente pode interferir na percepção que as pessoas têm do sabor e da textura dos alimentos.

Para o estudo, publicado na revista científica "Food Quality and Preference", pessoas vendadas avaliaram os sabores doces e salgados e o aspecto crocante de pratos com e sem barulho ao fundo.

Elas também disseram o quanto gostaram ou não dos alimentos nas duas situações. Os pesquisadores acreditam que os resultados do estudo podem ajudar a explicar o que leva a comida de avião a não ser apreciada por grande parte dos passageiros.

“Existe uma opinião geral de que comidas de avião não são ‘fantásticas’”, disse Andy Woods, um pesquisador dos laboratórios da Unilever e da Universidade de Manchester.

Woods afirmou que a pesquisa sobre a relação entre barulho e sabor foi a primeira no assunto e foi motivada pelo palpite sobre a comida servida nos voos.

“Tenho certeza que as companhias aéreas fazem o seu melhor – e por causa disso, começamos a nos perguntar se há outras razões pelas quais a comida não é tão boa. Uma das hipóteses foi a de que o barulho do avião tinha algum impacto”, disse à BBC.

“A Nasa dá a seus astronautas alimentos com gosto muito forte, porque, por alguma razão, eles não conseguem sentir o gosto. Isso também pode ser por causa do barulho”.

Mais crocante
Os 48 participantes do estudo comeram biscoitos doces e salgados enquanto escutavam barulho por fones de ouvido e em momentos silenciosos. Enquanto isso, eles marcaram a intensidade dos sabores e o gosto dos alimentos em uma escala.

O barulho usado na pesquisa foi o som branco, ruído que combina sons de todas as frequências. Quando o barulho era alto, a intensidade dos gostos doce e salgado descritas pelos indivíduos foram menores do que na ausência de som.

No entanto, o som alto aumentou a sensação de "crocância" dos alimentos, que é transmitida por canais auditivos. “Se o barulho de fundo é alto, nossa atenção pode se desviar da comida”, explicou o pesquisador Andy Woods.

O estudo também sugere que a satisfação com a comida está relacionada com o quanto as pessoas gostam do que estão ouvindo. Os pesquisadores devem realizar novos experimentos sobre o assunto.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Iphan tomba encontro de águas que forma Rio Amazonas


Tombamento é provisório e a medida vai vigorar até que o Conselho Consultivo do órgão se reúna para decidir tombar ou não a área em definitivo

11 de Outubro de 2010
por: Liege Albuquerque/AE

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) decidiu que, a partir de hoje, o fenômeno do encontro das águas, que forma o Rio Amazonas, está tombado provisoriamente. A medida vai vigorar até que o Conselho Consultivo do órgão se reúna para decidir tombar ou não a área em definitivo. Há uma reunião do conselho prevista para novembro, mas não há pauta definida.

Até lá, a obra do Porto das Lajes, a 2,4 quilômetros do fenômeno e orçada em R$ 220 milhões continua embargada. Por conta da falta de licenciamento ambiental do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), a obra já está paralisada há cinco meses. O tombamento da área, contudo, não condena em definitivo a obra: caberá à superintendência regional do órgão decidir sobre qualquer construção privada na área tombada, depois da sentença final.

Segundo o texto publicado hoje no Diário Oficial da União, no prazo de quinze dias, a contar da publicação desta notificação, "assiste aos proprietários dos bens abrangidos pela poligonal de tombamento a faculdade de anuir ou impugnar a iniciativa".

De acordo com o superintendente do Iphan no Amazonas, Juliano Valente, o tombamento provisório é um "passo preventivo" para preservar a área até a decisão definitiva. "Normalmente o Conselho Consultivo, se há um tombamento provisório, que é prerrogativa da presidência do Iphan, segue pelo mesmo caminho, mesmo que solicite outros estudos para embasar o julgamento".

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Com mais de 1,3 milhão de votos, Tiririca é deputado mais votado do país e deve levar mais 4



2010 pode ficar lembrado como o ano em que o Brasil elegeu um palhaço --de verdade-- para o Congresso Nacional. O palhaço Tiririca, codinome do cidadão Francisco Everardo Oliveira Silva, não só foi eleito como foi o candidato com a maior votação entre os postulantes a uma vaga na Câmara dos Deputados em todas as unidades da federação. Concorrendo pelo PR-SP, ele teve de 1,35 milhão. Ficou muito à frente do segundo mais votado do país, Anthony Garotinho (PR-RJ), ex-governador do Rio de Janeiro, que beirou 700 mil votos, e teve mais que o dobro do segundo mais votado em SP, Gabriel Chalita (PSB), escolhido por 560 mil eleitores.

É a segunda maior votação da história para deputado no Brasil: Tiririca só fica atrás de Enéas Ferreira Carneiro (morto em 2007), presidente do extinto Prona e detentor dos votos de 1.573.112 eleitores para deputado federal no pleito de 2002.

A campanha de Tiririca caracterizou-se pelo deboche, virou misto de sucesso e polêmica na internet e tema de todo tipo de discussão, dos debates intelectuais a conversas de botecos. Com essa receita, Tiririca conquistou eleitores --fica para os pesquisadores e analistas a tarefa de entender ou explicar se foi "voto de protesto", se foi um exemplo ousado de marketing ou um retrato do sentimento do descaso que o Congresso galgou na sociedade brasileira após anos de escândalos de corrupção-- e com mais do que o dobro dos votos do segundo candidato a deputado federal mais votado do Estado (Gabriel Chalita, do PSB), ele deve garantira a eleição de outros quatro candidatos de sua coligação (SP tem 70 cadeiras na Câmara).

A propaganda de Tiririca

Depois de ter virado celebridade televisiva nos anos 90, Tiririca decidiu neste ano tentar entrar na política. Vestido de palhaço, seu personagem, e em tom de comédia, Tiririca apareceu em diferentes inserções no horário eleitoral de seu partido, o PR. Identificando-se como "o candidato abestado", ele usou bordões e diz frases como as seguintes:

- "Vote no Tiririca, pior do que tá não fica!"

- "Oi gente, estou aqui para pedir seu voto porque eu quero ser deputado federal, para ajudar os mais 'necessitado', inclusive a minha família. Portanto meu número é 2222. Se vocês não votarem, eu vou morreeer!"

- "Oi, eu sou o Tiririca da televisão. Sou candidato a deputado federal. O que é que faz um deputado federal? Na realidade eu não sei, mas depois, eu te conto."

- "Quando vocês apertarem na urna eleitoral, vai aparecer esse cara aqui, e esse cara aqui sou eu. Ô candidato lindo!"

- "Você está cansado de quem trambica? Vote no Tiririca"

- "Para deputado federal, Tiririca. Vote no abestado"

- (escondendo o rosto): "Adivinha quem está falando? duvido vocês 'adivinhar'! " -- (após tirar as mãos do rosto): "Sou eeeu, o Tiririiiica, candidato a deputado federaaaal, 2222, não esqueeeeeça, peguei vocês, enganei vocês, vocês 'pensou' que fosse outra pessooooa, sou eu, o abestaaaaado, vote 2222!"

domingo, 17 de janeiro de 2010

A terceira margem do rio - conto e análise - Guimarães Rosa

A Terceira Margem do Rio
Guimarães Rosa


Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho e menino, pelo que testemunharam as diversas sensatas pessoas, quando indaguei a informação. Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ralhava no diário com a gente — minha irmã, meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, nosso pai mandou fazer para si uma canoa.

Era a sério. Encomendou a canoa especial, de pau de vinhático, pequena, mal com a tabuinha da popa, como para caber justo o remador. Mas teve de ser toda fabricada, escolhida forte e arqueada em rijo, própria para dever durar na água por uns vinte ou trinta anos. Nossa mãe jurou muito contra a idéia. Seria que, ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora para pescarias e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa casa, no tempo, ainda era mais próxima do rio, obra de nem quarto de légua: o rio por aí se estendendo grande, fundo, calado que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira. E esquecer não posso, do dia em que a canoa ficou pronta.

Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez a alguma recomendação. Nossa mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço e bramou: — "Cê vai, ocê fique, você nunca volte!" Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: — "Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?" Ele só retornou o olhar em mim, e me botou a bênção, com gesto me mandando para trás. Fiz que vim, mas ainda virei, na grota do mato, para saber. Nosso pai entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo — a sombra dela por igual, feito um jacaré, comprida longa.

Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais. A estranheza dessa verdade deu para. estarrecer de todo a gente. Aquilo que não havia, acontecia. Os parentes, vizinhos e conhecidos nossos, se reuniram, tomaram juntamente conselho.

Nossa mãe, vergonhosa, se portou com muita cordura; por isso, todos pensaram de nosso pai a razão em que não queriam falar: doideira. Só uns achavam o entanto de poder também ser pagamento de promessa; ou que, nosso pai, quem sabe, por escrúpulo de estar com alguma feia doença, que seja, a lepra, se desertava para outra sina de existir, perto e longe de sua família dele. As vozes das notícias se dando pelas certas pessoas — passadores, moradores das beiras, até do afastado da outra banda — descrevendo que nosso pai nunca se surgia a tomar terra, em ponto nem canto, de dia nem de noite, da forma como cursava no rio, solto solitariamente. Então, pois, nossa mãe e os aparentados nossos, assentaram: que o mantimento que tivesse, ocultado na canoa, se gastava; e, ele, ou desembarcava e viajava s'embora, para jamais, o que ao menos se condizia mais correto, ou se arrependia, por uma vez, para casa.

No que num engano. Eu mesmo cumpria de trazer para ele, cada dia, um tanto de comida furtada: a idéia que senti, logo na primeira noite, quando o pessoal nosso experimentou de acender fogueiras em beirada do rio, enquanto que, no alumiado delas, se rezava e se chamava. Depois, no seguinte, apareci, com rapadura, broa de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso pai, no enfim de uma hora, tão custosa para sobrevir: só assim, ele no ao-longe, sentado no fundo da canoa, suspendida no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o de comer, depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva e orvalho. Isso, que fiz, e refiz, sempre, tempos a fora. Surpresa que mais tarde tive: que nossa mãe sabia desse meu encargo, só se encobrindo de não saber; ela mesma deixava, facilitado, sobra de coisas, para o meu conseguir. Nossa mãe muito não se demonstrava.

Mandou vir o tio nosso, irmão dela, para auxiliar na fazenda e nos negócios. Mandou vir o mestre, para nós, os meninos. Incumbiu ao padre que um dia se revestisse, em praia de margem, para esconjurar e clamar a nosso pai o 'dever de desistir da tristonha teima. De outra, por arranjo dela, para medo, vieram os dois soldados. Tudo o que não valeu de nada. Nosso pai passava ao largo, avistado ou diluso, cruzando na canoa, sem deixar ninguém se chegar à pega ou à fala. Mesmo quando foi, não faz muito, dos homens do jornal, que trouxeram a lancha e tencionavam tirar retrato dele, não venceram: nosso pai se desaparecia para a outra banda, aproava a canoa no brejão, de léguas, que há, por entre juncos e mato, e só ele conhecesse, a palmos, a escuridão, daquele.

A gente teve de se acostumar com aquilo. Às penas, que, com aquilo, a gente mesmo nunca se acostumou, em si, na verdade. Tiro por mim, que, no que queria, e no que não queria, só com nosso pai me achava: assunto que jogava para trás meus pensamentos. O severo que era, de não se entender, de maneira nenhuma, como ele agüentava. De dia e de noite, com sol ou aguaceiros, calor, sereno, e nas friagens terríveis de meio-do-ano, sem arrumo, só com o chapéu velho na cabeça, por todas as semanas, e meses, e os anos — sem fazer conta do se-ir do viver. Não pojava em nenhuma das duas beiras, nem nas ilhas e croas do rio, não pisou mais em chão nem capim. Por certo, ao menos, que, para dormir seu tanto, ele fizesse amarração da canoa, em alguma ponta-de-ilha, no esconso. Mas não armava um foguinho em praia, nem dispunha de sua luz feita, nunca mais riscou um fósforo. O que consumia de comer, era só um quase; mesmo do que a gente depositava, no entre as raízes da gameleira, ou na lapinha de pedra do barranco, ele recolhia pouco, nem o bastável. Não adoecia? E a constante força dos braços, para ter tento na canoa, resistido, mesmo na demasia das enchentes, no subimento, aí quando no lanço da correnteza enorme do rio tudo rola o perigoso, aqueles corpos de bichos mortos e paus-de-árvore descendo — de espanto de esbarro. E nunca falou mais palavra, com pessoa alguma. Nós, também, não falávamos mais nele. Só se pensava. Não, de nosso pai não se podia ter esquecimento; e, se, por um pouco, a gente fazia que esquecia, era só para se despertar de novo, de repente, com a memória, no passo de outros sobressaltos.

Minha irmã se casou; nossa mãe não quis festa. A gente imaginava nele, quando se comia uma comida mais gostosa; assim como, no gasalhado da noite, no desamparo dessas noites de muita chuva, fria, forte, nosso pai só com a mão e uma cabaça para ir esvaziando a canoa da água do temporal. Às vezes, algum conhecido nosso achava que eu ia ficando mais parecido com nosso pai. Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pêlos, com o aspecto de bicho, conforme quase nu, mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia.

Nem queria saber de nós; não tinha afeto? Mas, por afeto mesmo, de respeito, sempre que às vezes me louvavam, por causa de algum meu bom procedimento, eu falava: — "Foi pai que um dia me ensinou a fazer assim..."; o que não era o certo, exato; mas, que era mentira por verdade. Sendo que, se ele não se lembrava mais, nem queria saber da gente, por que, então, não subia ou descia o rio, para outras paragens, longe, no não-encontrável? Só ele soubesse. Mas minha irmã teve menino, ela mesma entestou que queria mostrar para ele o neto. Viemos, todos, no barranco, foi num dia bonito, minha irmã de vestido branco, que tinha sido o do casamento, ela erguia nos braços a criancinha, o marido dela segurou, para defender os dois, o guarda-sol. A gente chamou, esperou. Nosso pai não apareceu. Minha irmã chorou, nós todos aí choramos, abraçados.

Minha irmã se mudou, com o marido, para longe daqui. Meu irmão resolveu e se foi, para uma cidade. Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. Nossa mãe terminou indo também, de uma vez, residir com minha irmã, ela estava envelhecida. Eu fiquei aqui, de resto. Eu nunca podia querer me casar. Eu permaneci, com as bagagens da vida. Nosso pai carecia de mim, eu sei — na vagação, no rio no ermo — sem dar razão de seu feito. Seja que, quando eu quis mesmo saber, e firme indaguei, me diz-que-disseram: que constava que nosso pai, alguma vez, tivesse revelado a explicação, ao homem que para ele aprontara a canoa. Mas, agora, esse homem já tinha morrido, ninguém soubesse, fizesse recordação, de nada mais. Só as falsas conversas, sem senso, como por ocasião, no começo, na vinda das primeiras cheias do rio, com chuvas que não estiavam, todos temeram o fim-do-mundo, diziam: que nosso pai fosse o avisado que nem Noé, que, por tanto, a canoa ele tinha antecipado; pois agora me entrelembro. Meu pai, eu não podia malsinar. E apontavam já em mim uns primeiros cabelos brancos.

Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo. Eu sofria já o começo de velhice — esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, não ia, mais dia menos dia, fraquejar do vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo, em tororoma e no tombo da cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha tranqüilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse — se as coisas fossem outras. E fui tomando idéia.

Sem fazer véspera. Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido não se falava, nunca mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido. Ninguém é doido. Ou, então, todos. Só fiz, que fui lá. Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e declarado, tive que reforçar a voz: — "Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto... Agora, o senhor vem, não carece mais... O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa!..." E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo.

Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n'água, proava para cá, concordado. E eu tremi, profundo, de repente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de gesto — o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos! E eu não podia... Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão.

Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio.


Texto extraído do livro "Primeiras Estórias", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1988, pág. 32, cuja compra e leitura recomendamos.


Análise da obra

O livro Primeiras estórias faz parte do terceiro tempo do Modernismo brasileiro e foi publicado em 1962. As 21 estórias, portanto, são narrativas preocupadas em tematizar, simbolicamente, os segredos da existência humana.

Trata-se do primeiro conjunto de histórias compactas a seguir a linha do conto tradicional, daí o "Primeiras" do título. O escritos acrescenta, logo após, o termo estória, tomando-o emprestado do inglês, em oposição ao termo História, designando algo mais próximo da invenção, ficção. Na obra há a intenção de apresentar fábulas para as crianças do futuro.

À primeira vista, a leitura de Primeiras Estórias pode, falsamente, parecer difícil e a linguagem soar erudita e ininteligível, mas essa é uma avaliação precipitada. Na verdade, o autor busca recuperar na escrita, a fala das personagens do sertão mineiro; a poesia presente nas imagens, sons e estruturas de uma linguagem que está à margem da norma estabelecida pelos padrões urbanos.

Quanto ao emprego dos tempos verbais, nota-se que, na maior parte das estórias, o relato se faz através de uma mistura do pretérito perfeito com o pretérito imperfeito do indicativo.

A obra aborda as diferentes faces do gênero: a psicológica, a fantástica, a autobiográfica, a anedótica, a satírica, vazadas em diferentes tons: o cômico, o trágico, o patético, o lírico, o sarcástico, o erudito, o popular.

As personagens embora variem muito quanto à faixa etária e experiência de vida, elas se ligam por um aspecto comum: suas reações psicossociais extrapolam o limite da normalidade. São crianças e adolescentes superdotados, santos, bandidos, gurus sertanejos, vampiros e, principalmente, loucos: sete estórias apresentam personagens com este traço.

A relação com a morte e com o desejo de imortalidade está presente em toda a obra de Guimarães Rosa, mas talvez com mais intensidade em "Primeiras Estórias".

Em cada um dos contos deste livro o narrador configura sua experiência de forma diferente, atravessando estágios emocionais distintos, conforme o ponto do percurso em que se encontra. Tanto em As Margens da Alegria, quanto em Os Cimos, contos extremos do livro, ele se identifica profundamente com o protagonista, como se ele espelhasse sua própria trajetória, sua infância, como se assim universalizasse, de certa forma, essa travessia. Ou seja, ele tenta perceber o que há de comum na infância de cada menino, nessas delicadas passagens, em seus estados de alma, nos dolorosos conflitos, nas fascinantes descobertas.

Os personagens de Rosa parecem caminhar pelas veredas da memória, vagar pelos labirintos de sua psique, ser guiados pelos fios das experiências por eles vividas e não completamente elaboradas no plano da consciência. Eles são movidos pela necessidade de transmitir suas vivências, para melhor compreendê-las e ordená-las em sua mente consciente. Diante do tempo transcorrido, os protagonistas rosianos mantêm uma constante atitude interrogativa.

Resumos dos contos

1. As margens da alegria - Narrado em terceira pessoa, esse primeiro conto de Sagarana, de Guimarães Rosa, é considerado, com o último, Os cimos, a moldura do livro, já que apresenta as mesmas personagens no mesmo ambiente.

2. Famigerado - Narrado em primeira pessoa, Famigerado, conto que faz parte da obra Primeiras estórias, de Guimarães Rosa, constitui-se num episódio cômico.

3. Sorôco, sua mãe, sua filha - Conto narrado em terceira pessoa, mas com a participação ambígua do narrador como personagem.

4. A menina de lá - A menina de lá , conto de Guimarães Rosa, da obra Primeiras estórias, é narrado em terceira pessoa.

5. Os irmãos Dagobé - Conto de Primeiras estórias, obra de Guimarães Rosa, tem narração em primeira pessoa (alguém do arraial, presente no velório e no enterro, que registra suas impressões sobre os irmãos Dagobé e possíveis acontecimentos futuros).

6. A terceira margem do rio - Este conto é narrado em primeira pessoa e é o mais famoso e o mais aberto conto do autor.

7. Pirlimpsiquice - Conto narrado em primeira pessoa, apresentando um narrador protagonista.

8. Nenhum, nenhuma - No conto Nenhum, Nenhuma, a indefinição do espaço se articula com a questão do tempo, na medida em que todas as referências a espaços indefinidos misturam-se à memória perdida que o narrador tenta recuperar; o que ele talvez resuma da seguinte forma: As lembranças são outras distâncias....

9. Fatalidade - Conto narrado em primeira pessoa (testemunha), cujos personagens são: Meu Amigo, delegado filósofo, que já foi de tudo na vida, e Zé Centeralfe, caboclo perseguido por um valentão que lhe quer roubar a esposa.

10. Seqüência - Em Seqüência, décimo conto de Primeiras Estórias, e narrado em terceira pessoa, nos deparamos com a história de uma busca.

11. O espelho - O espelho é o centro da obra Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, onde o narrador, em primeira pessoa, conta de sua luta para provar a falta de lógica e de sentido do mundo.

12. Nada e a nossa condição - Conto com narrador em primeira pessoa (testemunha), cujo personagem central é Tio Man'Antônio, mais um dos loucos iluminados de Guimarães Rosa.

13. O cavalo que bebia cerveja - Narrado em primeira pessoa Reivalino, um homem do meio rural e tem como tema o mistério, a não aceitação daquilo que é diferente.
14. Um moço muito branco - Este conto é introduzido por uma precisão espaço-temporal atípica em Guimarães Rosa e pode ser classificado como fantástico.

15. Luas-de-mel - O conto, narrado em primeira pessoa, introduz o motivo, fundamental na obra rosiana, do eterno feminino.

16. A partida do audaz navegante - Conto narrado em terceira pessoa, onde há duas histórias justapostas: a que nos conta o narrador, envolvendo as crianças; e a que Brejeirinha inventa sobre o “Audaz Navegante”.

17. A benfazeja - Mais uma vez a idéia de que "quem não está preparado para a verdade não a pode enxergar".

18. Darandina - Conto narrado em primeira pessoa, por uma testemunha do episódio, um plantonista de um hospício.

19. Substância - Este conto tem como personagem principal Sionésio, homem simples, trabalhador e calado.

20. Tarantão, meu patrão - Outro conto com anticlímax. É a estória de um "louco-iluminado" da galeria roseana, o Iô Jão-de-Barros-Dinis-Robertes, narrada em primeira pessoa por Vagalume, ajudante-de-ordens do protagonista e encarregado de cuidar dele, que, envelhecido, era dado a doideiras e desatinos.

21. Os cimos - Narrado em terceira pessoa, neste conto é retomado o mesmo tema de As margens da Alegria: a descoberta do mundo, de sua magia, dos ritos da tristeza e da alegria, dos ritos da travessia e de superação do medo a e da dor.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

No país das maravilhas



Brasília, DF, 2.010!
Alô, brasileiros e brasilienses...
O que se esperar das "grandes mentes brilhantes" (corruptíveis)? A cena parece aquelas à que assistiamos em meados do século passado: falo das cenas de faroeste - adorava ver os bandidos resistindo até o último momento de sua vida, renegando quaisquer culpas, saindo incólume de tudo e todo o mal que se fazia, às vezes, nós até os confundiamos com o mocinho, que aliás este parecia seu um capacho ou o culpado de ser íntegro!
A atual crise política na qual o País Brasil atravessa é, sem dúvida, uma discrepância indescritível; não há um único adjetivo para associar toda essa indecência, podridão, falta de vergonha e desrespeito ao povo brasileiro-brasiliense. Vejo o Governo do DF arrastando o cavalo de Tróia a oferecer para os seus habitantes. Já não basta mais atar as provas aos crimes, atar as faixas nos prédios (fora ARRUDA!) nem tampouco mostrar centenas de vezes os vídeos comprovando a verídica corrupção a qual foi desbancado o querido governador do DF. Parece que (parece nada!) é fato: cadeia não é lugar de ricos e poderosos. É nessa hora que me vem a imagem da representação da justiça, aquela mesma que está de olhos vendados, para fazer "justiça" a quem é de fato merecedor! (Ela baixa, devagarinho, a venda de seus olhos na calada da noite, no silêncio, alguém enche sua balança de dinheiro, já que não usa cueca nem meias. Negócio fechado!
O que será que Renato Russo ainda teria para musicar com tudo isso que está se passando em sua querida DF? Sei lá se ele não seria exilado! (Com certeza surgiria um "político magnata" de terno e gravata, com malas, meias e cuecas, baixando lei ou leis que proibissem a liberdade de expressão tal qual nos tempos da ditadura, e assim ferraria nosso querido Renato, e tantos outros Renatos que aparecessem!
Um abraço a todos os irmãos brasilienses-brasileiros!